terça-feira, 16 de julho de 2024

Redescoberta a arte da conversa que ficou muito necessária

A conversa é indispensável para a família ir bem
A conversa é indispensável para a família ir bem
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs







As distrações da tecnologia digital pareciam que levariam ao esquecimento da arte da conversação, observou a revista econômica “The Economist”.

A revista evocou a George Orwell que na sua famosa novela de um mundo de pesadelo escreveu que o rádio está sempre ligado e “a música impede que a conversa se torne séria ou mesmo coerente”. 

“The Economist" é uma revista laica e liberal focada com grande sucesso e respeitabilidade na atividade econômica. Dir-se-ia que não esse não é um tema de seu interesse nem dos seus leitores, na maioria empresários e homens de negócio.

Porém, a revista percebeu uma forte queda na habilidade de conduzir negociações nas novas gerações formadas num ambiente digital de mensagens instantâneas breves e simplificadas, mal redigidas a ponto de gerar confusão.

Lembrou o livro de 2006 do ensaísta americano Stephen Miller, intitulado “Conversa: História de uma arte em declínio”, em que o autor se preocupava porque os equipamentos de música digital e os computadores estão levando as pessoas a evitar as conversas reais com as pessoas.

Saber conversar é indispensável para o bom andamento dos negócios
Saber conversar é indispensável para o bom andamento dos negócios
Um crítico do livro de Miller considerou “surpreendente” que as gerações passadas gostassem de uma noite de conversa como uma forma de prazer social quando o americano moderno prefere passar a noite navegando na Internet.

Livrarias de Nova York como Barnes & Noble ou Borders oferecem prateleiras de manuais sobre como falar melhor. A maioria deles visa pessoas que desejam falar de forma mais persuasiva e envolvente para progredir em suas carreiras.

E para isso fazer amigos e influenciar pessoas, é preciso charme, cortesia e desejo de compreender as ideias e opiniões dos outros, ainda que só seja com interesse lucrativo.

Sir Isaiah Berlin, um filósofo letão de Oxford que morreu em 1997, foi tido como dos maiores conversadores que já existiram, comparável, Robert Darnton, historiador de Princeton, a Denis Diderot, o filósofo iluminista francês do século XVIII.

Um relato de época descreveu a conversa de Diderot como “animada por uma sinceridade absoluta, sutil sem obscuridade, variada em suas formas, deslumbrante em seus voos de imaginação, fértil em ideias e em sua capacidade de inspirar ideias nos outros.

“Deixávamos-nos flutuar durante horas seguidas, como se deslizássemos por um rio fresco e límpido, cujas margens eram adornadas com ricas propriedades e belas casas”.

A arte da conversa adquiriu um charme único na França antiga.
A arte da conversa adquiriu um charme único na França antiga.
Winston Churchill foi tido como talvez o maior orador do século XX. Virginia Woolf segundo um biógrafo, tinha “desempenhos maravilhosos em conversas, transformando-se em invenções fantásticas enquanto todos se sentavam e, por assim dizer, aplaudiam”.

O grande orador romano Cícero, do século I a.C., também é muito procurado.

Ele explicou a necessidade de “falar claramente; fale com facilidade, mas não muito, especialmente quando os outros querem a sua vez; não interrompa; seja gentil; lidar com seriedade com assuntos sérios e graciosamente com os mais leves; nunca critique as pessoas pelas costas; atenha-se a assuntos de interesse geral; não fale sobre você; e, acima de tudo, nunca perca a paciência”.

Dale Carnegie, que construiu seu credo em torno do ditado “time is Money” foi professor de oratória e em 1936 alertou para o fato de que os americanos precisavam de uma educação mais ampla na “bela arte de conviver”.

Seu livro “Como fazer amigos e influenciar pessoas” é impresso 70 anos depois e já vendeu 15 milhões de cópias.

As regras de conversação de Cícero estão na base das culturas e das épocas que sobressaíram na história.

A boa conversa e a boa educação têm características comuns ao longo do tempo e da cultura, e de fato os manuais mais recentes têm poucos princípios fundamentais a acrescentar.

Os manuais mais modernos à venda em New York acrescentam apenas conselhos mais concretos. Aliás, acrescentamos nós, intuitivos para os nobres mestres da conversa.

Por exemplo, cita “The Economist” cita as maneiras rápidas da Sra. Shepherd para saber se a gente está entediando seus ouvintes.

Sem boa conversa o encontro é tedioso e estéril.
Sem boa conversa o encontro é tedioso e estéril.
Por exemplo: “Nunca fale ininterruptamente por mais de quatro minutos de cada vez” e “Se você é a única pessoa que ainda tem um prato cheio de comida, pare de falar”.

Entretanto as dicas práticas não captam nada da alegria que advém do domínio da conversação. E essa alegria é a que mais atrai aos convivas. E a grande ausenta das comunicações digitais.

Madame de Staël, grande conversadora e intelectual do Antigo Regime francês, chamava a conversa de “um meio de dar prazer recíproca e rapidamente uns aos outros; de falar tão rápido quanto se pensa; de desfrutar espontaneamente; de ser aplaudido sem trabalhar”.

Platão elogiava Sócrates porque seus diálogos constituem “uma busca entre amigos... das ideias divinas do verdadeiro, do belo, do bom”, escreveu estudioso francês moderno, Marc Fumaroli.

A era de ouro da conversação foi elevada ao máximo grau do charme e do deleite pelas elites francesas no final do século XVII e início do século XVIII. Assim conquistaram o mundo que não entendia o que era ser culto sem seguir seu exemplo.

A aristocracia francesa voltou as suas energias para o entretenimento. Um homem que não dominasse a arte da conversa corria o risco de se ver desvalorizado, ainda que tivesse muitas outras qualidades.

A conversa dos salões e salas de jantar franceses tornou-se tão estilizada quanto um balé. Era básico cultivar a polidez (boas maneiras sinceras), esprit (inteligência), galanterie (galanteria), complacência (observação), prazer (alegria) e lisonja.

Até os silêncios deviam ser julgados com precisão. O duque de La Rochefoucauld distinguiu entre um silêncio “eloquente”, um silêncio “zombeteiro” e um silêncio “respeitoso”. O domínio de tais “ares e tons”, disse ele, foi “concedido a poucos”.

No Ancien Régime, o salão francês excluía a política das conversas educadas, mas nos cafés britânicos, aliás obviamente protestantes e pragmáticos, a política era a principal preocupação.

Os estrangeiros notavam neles uma liberdade de expressão e uma mistura de classes e profissões despreocupada com as formas e os floreios intelectuais.

A decadência atual vem de pelo menos há dois séculos.

A arte da conversa criou um ambiente propicio para o bom relacionamento em tudo
A arte da conversa criou um ambiente propicio para o bom relacionamento em tudo
O nobre Frances Alexis de Tocqueville entusiasmado pelos modos mais igualitários introduzidos no nascente EUA, no seu livro “Democracia na América”, observa que “um francês deve estar sempre falando, quer saiba alguma coisa sobre o assunto ou não; um inglês fica satisfeito quando não tem nada a dizer” e deplora a “estranha insociabilidade e a disposição reservada e taciturna dos ingleses”.

O escritor Charles Dickens, visitando a América do Norte no século XIX atribuía a culpa do espírito taciturno americano ao “amor ao comércio”, que limitava os interesses dos homens e lhes dava o temor de dizer coisas que beneficiassem a um concorrente.

“The Economist” ilustra a matéria que o preocupa com cenas brilhantes e distendidas da Belle Époque que hoje parecem pertencer a um mundo de sonho.

Entretanto, não só ilustram esplendidos e gaudiosos encontros sociais e familiares ou profundos debates intelectuais, mas também propiciam os grandes negócios.



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