Elizabeth II numa festa da coroação |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
O governante mais prestigiado do mundo completou 70 anos de reinado com índices de popularidade em volta de 90% no dia 6 de fevereiro [2022]: foi a rainha Elizabeth II ostentando uma coroa que vem desde a Idade Média.
Além de ser a mais antiga monarca reinante da história inglesa teve o casamento mais duradouro e fiel nos séculos de existência da realeza britânica.
Nunca antes tantos espectadores – estimados 300 milhões mundo afora, e até um bilhão pelo casamento de seu filho o príncipe Charles – acompanharam algumas das cerimônias de seu pomposo e equilibrado reinado.
Com mais dois anos, a rainha superará o reinado francês de Luís XIV, apelidado de “Rei Sol” pelo seu prestígio, que ocupou o trono do reino da França e Navarra por 72 anos e 110 dias, desde adolescente em 1643 até seu falecimento em 1715.
E Elisabeth II faz questão de esclarecer que ela não renunciará por idade ou saúde, como infelizmente fizeram outros monarcas em situações como a que ela pode enfrentar.
A rainha tem à sua disposição a mais deslumbrante e simbólica coleção de joias e coroas do mundo que usa para as grandes cerimônias segundo prescreve um cerimonial multissecular.
Mas na vida cotidiana não tem condescendência com a vulgaridade das modas modernas, usando sempre vestidos e chapéus elegantes, roupas desenhadas pelos antigos costureiros da corte real e meticulosamente adequadas a cada ocasião: nada é deixado ao acaso.
Além dos colares e joias que correspondem a uma tão distinta dama em cada ocasião.
Seu vestuário conserva um gosto inabalável há 70 anos obrigando os outros a se apresentarem na altura.
Mas os súditos são sempre recebidos com um sorriso cálido, um aceno amigável que faz explodir de agrado o gáudio popular nas ocasiões públicas, como nas festas de seu aniversário, todo início de junho.
Elisabeth II partilha o bolo dos 70 anos de reinado com uma determinação que pasma a seus mais íntimos |
Elizabeth, quando ainda só tinha 25 anos e apenas casada, recebeu a dolorosa notícia da morte de seu pai o rei George VI, durante uma visita protocolar no Quênia.
Vigorou como na Idade Média o princípio “O rei morreu, viva o rei!” Neste caso a rainha. A transição é instantânea.
A pomposa cerimonia de coroação aconteceu em 2 de junho de 1953, em grande cerimônia na Abadia de Westminster:
O arcebispo, infelizmente herético, pronunciou a fórmula tradicional: “Elizabeth II, pela graça de Deus, rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e de seus outros Reinos e Territórios, chefe da Commonwealth, defensora da fé” enquanto colocava sobre sua cabeça a maravilhosa coroa real.
A jovem rainha Elizabeth II retorno para o enterro do pai em 1952. |
Quem teria dito nesse dia que a frágil rainha haveria de se manter sete décadas completas à testa de um vasto leque de países em todos os continentes, num período que viu o colapso do Império Britânico, a Guerra Fria e, mais recentemente, o Brexit e a pandemia do coronavírus!
Ao todo, por protocolo deu o placet a 14 novos primeiros-ministros, chefes executivos de governo, no Palácio de Buckingham, das mais variegadas formações políticas, como Winston Churchill, Margaret Thatcher e o atual Boris Johnson. Todos passaram, subiram e caíram e a rainha ficou impertérrita no trono
Também sofreu dramáticas crises familiares, como as que provocou sua irmã Margaret com casamentos errados e o primeiro divórcio na família real britânica em mais de 400 anos.
Veio depois a grande decepção que se seguiu ao prestigiosíssimo casamento de seu primogênito o príncipe Charles com Lady Diana em 1981 (que morreu num acidente de carro em Paris, já divorciada).
Todos os outros filhos, exceto o mais novo Edward, atualmente alvejado por escândalos, divorciaram-se.
O mais novo de seus netos, o nascido príncipe Harry, renunciou à realeza e vive alimentando escândalos para a mídia ávida deles desde o “casamento” com a atriz americana Meghan Markle.
Elisabeth II não arreda cumprindo seus deveres com dignidade e disciplina |
Corajosamente, na sacada do palácio de Buckingham; nas incontáveis sessões ou visitas prescritas pelo protocolo quase todo dia; sentada sozinha no trono réplica do de Santo Eduardo III o Confessor, sob um baldaquino de ouro na Sala dos Lordes, ela sorri para todos e os empolga.
Como se explica isso, sobre tudo considerando os incontáveis governos e regimes que nesses 70 anos foram caindo, por vezes do modo mais calamitoso, no mundo todo, hoje sumidos no esquecimento ou na desgraça popular?
É um charme herdado da Idade Média que atravessou episódios dos mais obscuros da história.
Um charme ao qual a coroa inglesa – que mesmo não sendo católica como na origem, mas protestante anglicana! – impregna as instituições medievais nascidas sob a benção da Igreja Católica, regada com o sangue de santos e mártires, e que nenhuma invenção política humana consegue transmitir.
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